
O Dia do Orgulho LGBTI+ e a Luta pelos Direitos: Conquistas, Desafios e a Caminhada pela Igualdade
Postado em 30/06/2025
Por Sérgio Pessoa - Advogado, Professor Universitário, Presidente da Comissão de Diversidade Sexual e
de Gênero da OAB-PE e Conselheiro da ESA
No dia 28 de junho, celebramos o Dia do Orgulho LGBTI+, uma data que simboliza a
resistência, a luta por direitos e, sobretudo, a afirmação da identidade de cada indivíduo,
independentemente de sua orientação sexual ou identidade de gênero. Para muitos, esse
dia é um marco de celebração, mas também de reflexão. Refletir sobre a trajetória da
comunidade, sobre os desafios ainda enfrentados e, principalmente, sobre as conquistas
jurídicas que têm garantido avanços importantes na proteção e no reconhecimento dos
direitos da população LGBTI+ no Brasil.
Como advogado e professor universitário, tenho acompanhado a evolução dessa luta, que,
apesar de grandes vitórias, ainda enfrentamos uma sociedade marcada pela intolerância,
pela violência e por uma resistência, muitas vezes, institucionalizada. Por isso, o Dia do
Orgulho LGBTI+ não é apenas uma data comemorativa, mas também uma oportunidade
para discutir o caminho que temos percorrido até aqui e os obstáculos que ainda precisam
ser superados para que essa população tenha seus direitos assegurados.
As Conquistas Jurídicas: Passos Importantes Rumo à Igualdade
O movimento LGBTI+ no Brasil e no mundo tem se consolidado como uma das maiores
manifestações de direitos humanos da atualidade. A luta pela dignidade e pela igualdade
de direitos das pessoas LGBTI+ tem sido um processo longo, com vitórias jurídicas que
marcam uma trajetória de avanço significativo na proteção de direitos fundamentais.
Em 1988, com a promulgação da Constituição Federal, o Brasil deu um passo
importante ao estabelecer, no art. 5º, a garantia da igualdade entre todos perante a lei.
Esse princípio constitucional, embora não tenha abordado diretamente as questões
relativas à sexualidade ou identidade de gênero, foi fundamental para que a luta LGBTI+
pudesse ser sustentada juridicamente.
Nos últimos 15 anos, porém, o país viveu avanços marcantes no reconhecimento de
direitos. Entre as principais conquistas destacam-se:
- Reconhecimento da União Homoafetiva (2011): Em 2011, o Supremo
Tribunal Federal (STF) reconheceu a união estável entre pessoas do mesmo
sexo, assegurando-lhes os mesmos direitos de casais heterossexuais,
especialmente no que se refere à sucessão patrimonial, planos de saúde, pensões
e benefícios. - Casamento Civil Homoafetivo (2013): Dois anos depois, o Conselho Nacional
de Justiça (CNJ) determinou que todos os cartórios do Brasil devem celebrar o
casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, sem necessidade de autorização
judicial, consolidando, assim, o casamento homoafetivo em todo o território
nacional. - Criminalização da Homofobia e Transfobia (2019): Uma das vitórias mais
significativas ocorreu em 2019, quando o STF equiparou a homofobia e a
transfobia ao crime de racismo, tornando essas discriminações inafiançáveis e
imprescritíveis. Essa decisão marcou um divisor de águas no reconhecimento do
direito à vida e à dignidade da população LGBTI+, especialmente das pessoas
trans, que têm sido historicamente as mais vulneráveis à violência.
Esses marcos jurídicos representam vitórias que permitem que muitas pessoas LGBTI+
possam viver de forma mais digna e igualitária. Mas, como veremos a seguir, essa luta
continua, e a realidade cotidiana ainda está longe de refletir o que as leis garantem.
Desafios Persistentes: Barreiras Sociais e Institucionais
Embora as vitórias jurídicas tenham sido expressivas, a discriminação e
a violência contra a população LGBTI+ ainda estão profundamente enraizadas em nossa
sociedade. O preconceito estrutural persiste em diferentes esferas da vida social,
econômica e política, o que evidencia que, apesar das mudanças legais, a mentalidade da
maioria ainda não acompanhou os avanços legislativos.
A violência contra pessoas LGBTI+ é um exemplo claro dessa realidade. O Brasil é um
dos países com os maiores índices de homicídios de pessoas trans no mundo, o que torna
evidente que, embora a transfobia tenha sido criminalizada, as políticas de segurança
pública e de justiça ainda não tem atuado de forma suficiente para coibir esse tipo de
violência. A impunidade e a falta de conscientização por parte de autoridades, muitas
vezes, contribuem para a perpetuação dessa situação.
Além disso, muitas pessoas LGBTI+ enfrentam dificuldades no acesso à saúde, ao
emprego e à educação. O preconceito no ambiente de trabalho é uma realidade para
muitas pessoas gays, lésbicas e bissexuais, que são muitas vezes alvo de piadas, assédio
ou até mesmo de demissões injustas. As pessoas trans enfrentam obstáculos ainda
maiores: falta de acesso à saúde adequada, especialmente à cirurgia de redesignação
sexual, e dificuldades imensas de inserção no mercado de trabalho, que as empurram para
a marginalização social.
Outro problema persistente é a invisibilidade das pessoas intersexuais, que muitas vezes
não são sequer reconhecidas nas discussões sobre a diversidade sexual e de gênero. Sua
luta por direitos e reconhecimento segue sendo negligenciada, o que se reflete na falta de
políticas públicas específicas para essa população.
Em relação à educação, o bullying homofóbico nas escolas continua sendo uma grande
barreira para a formação acadêmica de jovens LGBTI+. A resistência de alguns setores
conservadores em abordar temas relacionados a gênero e sexualidade no currículo escolar
contribui para o aumento da intolerância e do sofrimento psicológico desses jovens.
O Papel do Direito: Avançar Além das Leis
O direito, por si só, não é suficiente para garantir a plena igualdade. A legislação
brasileira tem demonstrado, com algumas de suas decisões mais recentes, um
compromisso crescente com a proteção dos direitos da população LGBTI+. Contudo,
a aplicação dessas leis depende de uma mudança cultural profunda, que deve ocorrer
tanto na sociedade quanto nas próprias instituições públicas e privadas.
O Judiciário tem cumprido um papel fundamental, mas é necessário que as decisões
sejam seguidas de ações concretas para assegurar que pessoas LGBTI+ possam viver de
fato sem medo de discriminação. O Estado também precisa ir além da simples promoção
de direitos e agir na implementação de políticas públicas efetivas, como ações
afirmativas no mercado de trabalho, medidas de combate à violência e promoção de uma
educação inclusiva.
O movimento LGBTI+ e a sociedade civil têm, portanto, um papel decisivo na
construção de uma sociedade mais inclusiva e justa. A conscientização da população
sobre a diversidade sexual e de gênero deve ser intensificada, e as leis (ou ausência delas
no Brasil), precisam ser implementadas e aplicadas de forma justa, de modo a evitar que
discriminação e violência continuem a ser um problema tão presente a essa comunidade.
Conclusão: O Orgulho LGBTI+ Como Símbolo de Luta e Esperança
O Dia do Orgulho LGBTI+ deve ser uma data de celebração, mas também de resistência
e luta por direitos. A resistência que essa comunidade representa é, antes de tudo, uma
resistência à intolerância, à violência e ao preconceito. E a luta, embora tenha conquistado
vitórias jurídicas importantes, ainda precisa avançar em muitos campos, especialmente
no que diz respeito à efetivação dessas vitórias no dia a dia das pessoas LGBTI+.
O caminho é longo, mas o que vemos até hoje é um movimento que se fortalece a cada
ano, com mais pessoas se levantando e dizendo “basta” às violências e discriminações
sofridas. O Orgulho LGBTI+ não é apenas uma festa, mas um grito por
igualdade, justiça e dignidade. A verdadeira conquista virá quando todas as pessoas,
independentemente de sua orientação sexual ou identidade de gênero, puderem viver
livremente, sem medo de repressão ou marginalização.
Que o Orgulho LGBTI+ continue sendo um símbolo de luta, visibilidade, esperança e
garantia de direitos, para que as futuras gerações possam viver em um mundo onde a
igualdade de direitos não seja uma luta, mas uma realidade consolidada.
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